ANTB é a Associação Nacional de Treinadores de Basquetebol. Fizemos uma entrevista sobre como cheguei a Lugo, o meu curriculum como jogador e como treinador e também comparando as realidades entre o basquetebol Português e Espanhol. A continuação pode ler a estrevista.
Como cheguei a Lugo…
ANTB – Gustavo, tens 30 anos e, salvo erro, este é o teu nono ano em Espanha. Conta-nos como foste parar ao país vizinho e o que te fez “criar raízes” em Lugo.
Eu estava nos seniores do F.C.Porto quando decidiram emprestar-me por estar a ter poucos minutos de jogo na equipa principal.
Num telefonema com o Cristino Menor (foi o coordenador da formação do F.C.Porto durante 5 anos, acompanhou todo o meu crescimento como jogador desde iniciado a sénior) que era e continua a ser o Director desportivo Club Estudiantes Lugo, surgiu a possibilidade de integrar a equipa no Club Estudiantes Lugo da liga EBA e treinar com o C.B.Breogán. Fiz um teste e comecei esta aventura.
No primeiro ano em Lugo tive uma lesão grave no joelho e estive parado muito tempo, tanto o Cristino como o treinador do Breogán naquele momento (Paco García) encaminharam-me tanto para os estudos na minha área (Informático, programador) como para o de treinador.
Durante os primeiros anos continuei a jogar e a treinar a equipas de mini-basket e iniciados. Quando acabei os estudos encontrei trabalho e abandonei a dinâmica de liga EBA para passar a jogar na Liga 1a Nacional também nos Estudiantes Lugo por ser mais compatível com o trabalho (já estou desde 2012 na mesma empresa).
Á 3 anos deixei de jogar, depois de ter recebido um convite do Cristino para ser o treinador da equipa de 1a Nacional onde jogava.
Este meu percurso aqui em Lugo, também se deve à forma como o clube me integrou positivamente nos contextos desportivos e sociais da cidade.
ANTB – Começaste como treinador ainda jogavas? Como foi essa transição da vida de jogador para a de treinador? O que te motiva a ser treinador?
Sim, treinei os minis, iniciadas e cadetes femininas e depois os juniores masculinos B enquanto continuava a jogar.
Temos a sorte de na Galiza todos os clubes colaborarem na hora de alterar jogos para que não coincidam com as outras actividades dos praticantes o que tornou possível esta acumulação.
A transição foi um passo difícil de assimilar porque no ano anterior era companheiro de balneário e no ano seguinte era o treinador na equipa de 1a Divisão Nacional (a divisão inferior da Liga EBA).
Tive a sorte de ter ao meu lado 3 pessoas, o Cristino, o Alex Polo (treinador da equipa sénior no momento da transição) e o meu pai que gostava de destacar pela confiança, pela tutorização e por todas as horas que falamos e continuamos a falar de basquetebol.
No primeiro treino da época os jogadores demonstraram que sabiam a diferença, entre dentro e fora do campo sendo um ano muito bonito e do qual tenho muitas boas memórias.
Tenho a sorte de pertencer a um clube que, mais do que os resultados, o que nos interessa é formar e preparar jogadores para a alta competição. Neste momento, da formação dos Estudiantes de Lugo, temos muitos jogadores que sairam directos para as ligas superiores como a Leb Plata ou Leb Oro e que estão a ter o seu espaço nas equipas, e isto é o que me motiva, ver como crescem e como melhoram dia a dia.
Sobre Club Estudiantes Lugo…
ANTB – O teu clube, Estudiantes de Lugo, tem todos os escalões de formação do mini até aos seniores, sendo equipa satélite do Breógan que milita na LEB Oro. Tu começaste nos escalões de formação e depois duma época bem sucedida a treinar o escalão sub18 estás agora orientar os seniores do clube. Fala-nos desse teu trajecto enquanto treinador.
Até hoje só fui treinador neste clube, formei-me como treinador sempre em Espanha e tenho o curso de nível 3 que fiz no verão de 2015. Nos Estudiantes Lugo já fui treinador em todos os escalões e incluso no masculino e no femenino.
O ano passado com a equipa de sub-18 fomos campeões galegos e fomos ao campeonato de Espanha onde nos tocou o grupo da morte com 3 equipas de formação da ACB (Estudiantes de Madrid, Baskonia e Unicaja de Málaga) perdemos todos os jogos mas estivemos quase a dar a surpresa frente ao Unicaja onde só perdemos por 3 pontos num jogo que dificilmente esquecerei pelo nível que demonstramos.
Neste momento sou o treinador principal da equipa senior da Liga EBA do Club Estudiantes Lugo Leyma Natura, tivemos muitas lesões neste inicio de época mas estamos terceiros com 8 vitorias e 3 derrotas e optamos a tudo. O objetivo era não descer mas neste momento com todos os jogadores recuperados devemos disfrutar do que fizemos e continuar a trabalhar igual que até agora, preocupar-nos com a melhora individual e ir jogo a jogo optando a tudo numa liga em que as equipas estão a investir muito dinheiro nos seus planteis.
Comparando entre Portugal y Espanha…
ANTB – Tendo em conta esta tua “aventura” espanhola nos últimos anos, dirias que conheces bem a realidade do basquetebol espanhol? És capaz de a comparar com a nossa, seja na formação, seja na competição?
Conheço bastante bem a realidade do basquetebol Espanhol tanto pela etapa de jogador como agora de treinador e do basquetebol Português porque felizmente tenho muitos amigos em Portugal, inclusivé o meu pai (actualmente treinador da equipa senior da Juventude Pacense) que me vão contando as ultimas novidades e alterações.
Procuro ver jogos das ligas portuguesas, mas confesso que nem o tempo é muito nem há muita facilidade para poder ver online desde aqui.
Para mim há uma realidade que é o numero de practicantes, permitindo que em Espanha haja muitos mais atletas e portanto maior numero de talentos.
Para que façam uma ideia o nosso clube numa cidade de 100.000 habitantes tem 11 equipas mini, 8 equipas de iniciados, 5 equipas cadetes, 3 juniores e 2 seniores sem contar com a equipa senior do C.B.Breogán, e com outras equipas como por exemplo Club Porta XI – Ensino que também tem todas as categorías mas só em feminino.
Isto acontece não só devido ao número de habitantes mas também, aos êxitos da Seleção Espanhola, existirem clubes a proporcionar excelentes espectáculos na Euroliga(Real Madrid, Barcelona, Perfumarias Avenida, etc) e por causa da carreira desportiva de jogadores como os irmãos Gasol, Calderón, Sergio Rodriguez, Navarro, etc. na NBA que faz com que mais jovens queiram praticar basquetebol.
Onde realmente vejo que podemos melhorar é na formação dos jogadores portugueses.
Primeiro na formação dos treinadores, no clube onde sou treinador existem 10 treinadores com curso de Grau 3 e o clube ajuda economicamente e incentiva na formação dos treinadores.
Em segundo lugar e depois de ter sido formado em Portugal e agora dedicar-me a formar jogadores em Espanha considero que em Espanha dedicamos muito tempo do treino á técnica individual defensiva e ofensiva, à leitura de espaços, ao treino da tomada de decisão e ao jogo sem bola.
Pelos jogos de formação que vi ultimamente em Portugal, é um jogo:
- mais fisico, mais agressivo na utilização das mãos, mas rapidamente penalizado nas competições europeias de seleções ou em ligas estrangeiras;
- jogadas muito longas com demasiadas opções ou bloqueios demasiado complexos para a pouca qualidade de técnica individual dos jogadores que vi jogar;
- sem as leituras e tomadas de decisão adequadas ás situações de jogo.
Dentro da formação existe a adaptação e integração do jogador jovem quando chega a equipa senior, em Espanha os jogadores mais veteranos disponbilizam-se a no final do treino fazer técnica individual com os jogadores mais jovens ou os próprios treinadores dedicam tempo extra com cortes de vídeo dos erros individuais do ultimo jogo ou inclusivé de treinos.
Em todo o momento o jogador jovem sabe o seu papel e o que tem que melhorar, no nosso clube todos os jogadores têm no mínimo uma ou duas sessões de técnica individual por semana com o Cristino sempre enquadrado dentro da planificação semanal da equipa onde jogam.
Um tema, sempre delicado, dos estrangeiros nas equipas de formação, no clube optou-se por trazer jogadores de fora (tanto fora de Lugo cidade, como estrangeiros) por um motivo simples, melhorar a equipa em posições que não temos jogadores.
Lugo é uma cidade de pessoas pequenas, somos capazes de formar bons bases e bons extremos mas não temos postes por falta de altura, então, vamos buscar postes para não ter que colocar um extremo de 1,90m a jogar dentro, e que seja um poste só porque é alto, quando na alta competição nunca vai ocupar essa posição.
Neste aspecto acho que Portugal cada vez tem gerações mais altas e devíamos investir mais na deteção destas pessoas e permitindo-lhes o melhor enquadramento desportivo e técnico.
Ao nível da competição vejo o sistema de subidas e descidas mais interessante em Espanha, quer em termos desportivos quer em termos orçamentais.
Para subir de Leb Plata a Leb Oro ou de Leb Oro a ACB ao campeão da fase regular, é atribuido o título de Campeão e sobe directamente, já não joga os playoffs enquanto que do segundo ao nono jogam uns play-off de subida.
Existe um prémio á regularidade e o outro lugar fica para atribuição na lotaria dos Play-offs, permitindo ao campeão poupar um mês de orçamento e iniciar mais cedo a preparação da próxima época desportiva.
Existe também a diferença de orçamentos entre os clubes em Espanha e em Portugal.
Aqui, julgo que podemos melhorar, devemos obter mais recursos e ter pessoas dedicadas a conseguir mais patrocínios.
Devem existir plataformas preparadas para mostrar esses patrocínios, por exemplo na nossa equipa senior todos os jogos em casa são trasmitidos em directo pelo nosso canal de Youtube en HD e há uma media de 300/400 visualizações por jogo, são divulgadas informações no Twitter e no Instagram, é mais fácil conseguir um patrocinio com dados estatísticos mais
exactos onde realmente se possa demonstrar que o produto do patrocinador vai chegar a uma determinada audiência, significando um investimento e não uma despesa para o mesmo.
O meu futuro…
ANTB – Relativamente ao teu futuro enquanto treinador, o que esperas dele? Pensas em tornar-te treinador profissional a tempo inteiro?
Quero disfrutar deste ano na Liga EBA, continuar a melhorar os jogadores do clube e cumprir com os objetivos que me propuseram. Pessoalmente espero continuar a melhorar como treinador, falar muito de basquetebol com outros treinadores ou outras pessoas ligadas á modalidade, e estar preparado, para se algum dia surgir a possibilidade de um projeto aqui, em Portugal ou noutro local em que possa ser treinador profissional a tempo inteiro, possa desempenhar essa função com a maior seriedade e profissionalismo.
ANTB… Gracias.
Espero que tenha gustado da entrevista, pela minha parte agradecer a ANTB pela oportunidade e por lembrar-se de mim para esta entrevista.
Podes ver a versão original da entrevista a ANTB clicando aquí.